terça-feira, 14 de maio de 2013

Iberman 2013 - Finisher




POST SCRITPTUM: Este post é looooooooooonnngo!

Nem sei por onde começar...
No sábado passado levantei-me às 4 da manhã para rumar a Ayamonte a fim de participar num desafio que me "atormentava" já há 4 meses. Não foram 4 meses de treino duro, mas envolveu muito sacrifício na medida em que dependi da boa vontade da família e do seu tempo disponível para que pudesse treinar um pouco mais do que o habitual. E nisso tenho de agradecer e muito o apoio de pais, sogros, filhos e marido.

A agradecer tenho também os meus colegas de triatlo, núcleo forte de companheirismo. Muitas vezes, foi por eles que mantive a esperança de participar. Obrigada sobretudo ao David Caldeirão, nosso "mentor", nosso mestre nesta caminhada dos últimos meses, que nos apoiou mesmo à distância.

É que isto de tentar treinar uma média de 10h semanais (houve semanas de 13h-15h) parece coisa pouca, mas ou há ali uma tremenda força de vontade ou não se consegue cumprir os objectivos mínimos. 

Foram dias complicados em que saí muitas vezes de casa com um grande peso nos ombros por causa do sentimento de culpa por largar a família em mais uma manhã, ou então por simplesmente não me apetecer fazer mais um treino longo por causa do frio ou do vento ou da ameaça de chuva, preferindo antes ficar no quentinho debaixo das mantas. 

Mas quem corre por gosto, não cansa, e a verdade é que na maioria das vezes, consegui cumprir o estabelecido e a prova disso chegou no dia 11 de Maio, quando me apresentei às 5 da manhã em Ayamonte para participar no triatlo de longa distância (ou Ironman 70.3, já agora!) Iberman. 

1.ª PARTE

Estava um dia frio e ventoso. Vento norte. Deu logo para fazer as contas e saber que íamos apanhá-lo de frente nos primeiros 40-50km do segmento de ciclismo.

Do parque de transição, caminhámos cerca de 1km até ao cais onde iríamos apanhar os barcos que nos transportariam até meio do rio para iniciarmos aí o segmento de natação na distância de 1.8km.

Já no barco, falavam que as senhoras iriam partir 1min. mais tarde que os homens. Não pareceu fazer sentido mas resignei-me. Estava então descansadinha da vida, pois tinha tempo... Subitamente, mandam-nos saltar para a água para supostamente alinharmos todos juntos mais à frente. Lá nadei tranquilamente até essa suposta linha de partida. Quando levantei a cabeça reparei que já havia atletas quase a chegar a Ayamonte e eu ali meio perdida sem noção de que havia sido dada a partida... Aí usei o bom senso e comecei a dar ao braço, eh, eh, eh...

Nadei sempre um pouco ao largo, enquanto via a maioria muito junto à margem. Mais tarde soube que muitos chegaram a caminhar junto à margem devido à maré tão baixa e cortaram-se nas cascas de bivalves.

Levei poucos pontapés, afastei-me sempre que senti alguém a querer atropelar-me e acho que até me saí bem...

Felizmente a maré estava a baixar e mais de metade do percurso foi quase a ser empurrada pelo rio que estava a desaguar para o mar. Apenas no interior da marina é que tivemos de lutar contra a corrente da água que saía.

A parte mais radical foi quando me aproximei da margem para sair de dentro de água. Mal tento colocar-me na vertical, não consigo pois tenho lodo/lama até às coxas a querer afundar-me. Tal como a maioria dos colegas também me cortei em vários sítios dos pés, mas com a adrenalina na altura não sentimos nada. Ontem ainda andava coxa de um pé por causa de uma ferida ainda aberta.

Foi uma luta vs máscara de beleza. Só tenha pena é de aquela lama, de cheiro muuuuiiiito suspeito, não me parecer ser daquelas com grandes benefícios para a beleza e saúde da pele, tipo a do Mar Morto. É que aquele mar dentro da marina estava mais que morto, estava já em decomposição, e nós ali no meio. Bem, mas passemos à frente que isso já não importa nada.

2.ª PARTE

Perdi mais de 6' na primeira transição, o que é um exagero tremendo quando a média da maioria dos atletas foi de 2'-3'. Eu não queria vestígios daquele tratamento de beleza no meu corpo e daí ter-me distraído um pouco.

O segmento de ciclismo e eu estava com receio do frio que ia apanhar por causa do vento que soprava de noroeste. Ao fim de 5 km já não sentia frio, pois o percurso começou logo com uma subidinha para ajudar a aquecer.

O trânsito não esteve condicionado fora da zona urbana de Ayamonte, o que significa que tivemos de pedalar na esperança dos condutores serem compreensivos/misericordiosos. E foram, tudo correu cinco estrelas. 

Apanhámos vento na primeira metade do percurso, o que foi bastante duro, especialmente para as pessoas que evitam pedalar em dias de ventania (eh, eh, eh). Tive o privilégio de ser acompanhada durante cerca de 20-30km pelo meu colega de equipa Filipe Conceição, que ainda há poucas semanas esteve em África do Sul a participar num Ironman, e que no seu dia de aniversário apareceu às 7 da manhã em Ayamonte para nos vir apoiar. Ganda Flip!

O Filipe foi um bom apoio mas como é proibido o drafting, estive a ver a minha participação em risco, pois os juízes vieram "avisar-me". Foi nessa altura que o ritmo baixou e perdi o grupo em que ia inserida, e onde seguia a vencedora do dia, Maria Sierra, que me tinha apanhado alguns km antes. 

A partir daí segui sempre sozinha até cerca do km70... 

Por causa da partida acidentada na natação, não tive tempo para um xixi, o que me deixou aflita durante a primeira parte do ciclismo. Perdi tempo e concentração a tentar descobrir onde parar para um pit stop. Complicado...

A subida junto a San Lúcar de Guadiana de cerca de 2-3km foi a parte mais agressiva, em que pensei que a bicicleta ia parar. Felizmente, nuestros hermanos são um povo fantástico na sua maioria, e ali tive sempre apoio moral do público e voluntários que nos mantinham animados com as suas palavras de incentivo e boa disposição. 

Chegando a El Granado, tomei a decisão de parar na bomba de gasolina para ir ao wc. Tive de ir pedir a chave, depois não consegui abrir a porta, tive de pedir ajuda ao rapaz para me abrir a porta, despir um fato com um fecho complicado nas costas...Ai, ai... sei que perdi pelo menos ali uns 5-6 minutos. Mas teve de ser...quando voltei à estrada senti-me outra.

E verdade seja dita, foi também aí que começámos a ter vento lateral e posteriormente foi a rolar um pouco pela planície e depois, com vento quase nas costas, por uma estrada ondulante que nos permitiu atingir boas médias de velocidade. 

Foi a partir daí que comecei a ultrapassar alguns colegas (novidade para mim, ultrapassar alguém no ciclismo, segmento onde sou mais fraca!!!), e que serviu para me aumentar o ânimo.
Infelizmente, distraí-me mais uma vez, deixei cair um gel no chão e voltei atrás, com receio de que aquele gel fosse fazer falta (era o último), e fui ultrapassada. Posições que felizmente ainda consegui recuperar.

Não sei se a minha estratégia foi a mais correcta, pois pensei sempre em resguardar-me até El Granado e a partir daí puxar mais a sério pelas pernas, mas olhando agora para trás talvez devesse ter arriscado mais. Não sei se a minha fc média de 156-158bpm poderá ter influenciado esta minha decisão nos primeiros 50km, com receio de poder afectar o rendimento na corrida. A verdade é que nunca corro com pulsómetro nas provas e desta vez não sei se foi positivo.

No final do segmento cumpri os cerca de 100km com média aprox. de 26km/h, o que para o meu nível até nem foi mau.

3.ª PARTE

Na 2.ª transição já tinha a família junto ao meu "lugar de estacionamento", o que foi motivo de satisfação para mim. A minha pequenina perguntava: "Onde vais mamã?", " A mamã vai ali correr um bocadinho e já vem".

Saí para o segmento de corrida muito bem, com muita adrenalina, a correr abaixo dos 5'/km nos primeiros 2km, a achar que o pior já tinha passado e que agora os cerca de 20km seriam cumpridos com alguma ligeireza dentro de uma média máx. de 5'30''/km.

Assim que chego à zona do "deserto"( corremos numa zona muito isolada à uma da tarde, sem sombra, sem público, num percurso ligeiramente acidentado de terra batida, areia e pedras), o calor começa a apertar comigo e o ritmo começa a baixar gradualmente para 5', 5'15'', 5'20'', 5'30''.

Até aí tudo bem, ultrapasso 2 colegas... e ao longe avisto outro atleta que corria uns metros, caminhava, parava, andava, parava ... Aquilo mexeu comigo, pois nessa altura comecei a sofrer com o calor, sentia a boca muiiitto seca, e aquela imagem de sofrimento afectou-me... Comecei a pensar para mim, que se não ultrapassasse aquele senhor, entraria no mesmo compasso, de parar e andar.

Lá o ultrapassei mas a partir daí senti que começou uma luta interna entre a mente e o corpo. No meu caso, era a mente que estava a querer trocar-me as voltas. Eu sabia que o corpo aguentava, mas a minha mente só me dizia que com aquele calor, era bom era beber um copinho de água, tomar um duche fresco e estar sob uma bela sombra...

Naquele momento decidi que iria correr sempre, mas que nos postos de abastecimento iria beber à vontade e até parar para o fazer. E assim foi, em cada abastecimento (tivemos 4) parei para beber e no penúltimo, na vila de Redondela, foi um exagero. Entrámos na vila, depois da travessia do deserto e quando encontro o posto de abastecimento tenho lá uma bela sombra com Barcelona dos Queen a tocar em estilo triunfante aos berros e  na mesa um belo banquete de frutas e bebidas. Não é demais dizer que o pessoal que lá estava era simpaticíssimo e que ainda fiquei lá uns minutos de conversa (2-3'). A partir daí já só faltavam cerca de 6km até ao final.

Saímos da vila e fomos por uma estrada alcatroada até ao pinhal que nos levava até à praia. Aí o vento estava a soprar de oeste, de frente mais uma vez. 

Estes últimos 3km foram duros mesmo sabendo que lá ao fundo estaria a meta à nossa espera (nem se conseguia visualizar o pórtico àquela distância). Mas para quem costuma correr na praia, sabe que 3km no areal parecem infinitos...

A pouco menos de 1km, tive a alegria de ver o meu pardalito e o meu pai a correr na minha direcção. E pouco mais à frente a minha pardalita voadora com a minha mãe. O marido fotógrafo estava ali também. Correram a meu lado uma pequena parte, mas à minha velocidade "supersónica" (eh, eh, eh) foi difícil acompanharem-me.

Ao sentir a meta já ali a poucos metros senti a emoção à flor da pele. Há cerca de 2 semanas tinha quase tomado a decisão de não participar e agora estava ali a terminar. 
À chegada tinha os meus queridos colegas a congratularem-me, o que também foi muito especial.

Obrigada a todos os que estiveram presentes fisicamente e, outros espiritualmente, a apoiar-me. 
Agradeço também à organização, pelo empenho e esforço demonstrado. 

Missão cumprida! Soy una finisher Iberman!

Tempo final oficial: 6h23:48 para 1.8km - 100km - 19km

Se para o ano cá estarei? Assim que cheguei disse aos meus colegas que tinha sido a primeira e provavelmente a última vez que fazia uma coisa daquelas.

Mas passadas umas horas e sentindo-me bem (à parte das queimaduras solares e corte no pé), comecei a pensar na hipótese de voltar a repetir esta façanha. Talvez Lisboa em 2014. Mas aí só se a vida no próximo ano o permitir.

Mas se não for em 2014, desconfio que, havendo saúde, voltarei a ser uma finisher num dos próximos anos.

Para lerem sobre outra perspectiva desta corrida, sugiro a leitura do divertido blog do meu querido colega Luís aqui. No meu post refiro-me a uma subida como tendo 2-3km, ele 1km. Isto para mostrar que para duas pessoas diferentes há sempre versões diferentes da história.

Em Outubro, o Iberman estará de volta para o dobro da distância.
Nessa altura estarei novamente presente, mas para apoiar os amigos que irão participar nessa loucura que envolverá as distâncias de 3.8km a nadar, 180km a pedalar e 42km a correr. Será para muitos 16 horas de muita dureza e adrenalina. Para mim, será mais uma vez uma alegria poder estar de alguma forma envolvida num ambiente que adoro.

IBERMAN: Siempre!

(Obrigada aos fotógrafos Luís Mestre, Bruno Ribeiro e Luís Santos.)


Perto do parque de transição com João Rita, Igor e Luís.

A aguardar pela boleia dos barcos.


E lá fomos rio acima.


Os atletas a atirarem-se para dentro de água.

A "falsa" partida...

No rio estava-se tão bem...



E aqui começa a parte radical, com lodo e lama até às coxas.

Pareciam areias movediças, a puxar para baixo.


Escalada à SEAL!

Na 1.ª transição perdi mais de 6'.
Nas fotos percebe-se como.



O melhor final de sempre
com os meus pais, filhos, marido e amigos à minha espera.


Já consigo ver a meta!!!



Com Luís, Maria Inês, João, Fabinho, Nelson, David e Igor.

Junto à linha de meta.

No hotel Barceló Isla Cristina,
que serviu de base para a organização e atletas.



A nossa medalha de Finisher: linda!


As Noosa portaram-se bem,
mesmo num percurso tipo trail e areia. 

É sempre um orgulho estar ao lado de "campeónas",
que me deram 10 a 0.


A grande vencedora feminina, Maria Sierra,
que me ultrapassou no ciclismo e fez um excelente segmento de corrida.

11 comentários:

  1. Bolas! Até fico cansado só de ler o relato! Que vontade deve ter para completar uma prova deste género! Parabéns pela prova concluída e pela classificação obtida! Um dia gostava de experimentar um duatlo, nunca um triatlo, porque eu e a água não nos damos muito bem...

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  2. Parabéns Lénia :) Muito orgulho na nossa família e nessa enorme força de vontade! Beijinhos.

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  3. Lénia, 3 dias depois do grande evento estou mesmo chateado com aquela natação. Nós terminámos bem, diria mesmo, com alguma folga física, e sem dores musculares que impedissem um andar normal. Porém, os cortes nos pés estão a impedir-me neste momento de pensar em qualquer corrida e dificultam-me mesmo o andar. Hoje então isto está para esquecer. Que raio de estupidez aquela. O escaldão, pronto, é uma ferida que seria difícil evitar, a não ser que houvesse alguém ali junto ao PT disposto a passar creme. Mas estes cortes tinham sido bem evitados pela organização.
    Já viste? Tanta incerteza, tanta dúvida e no fim, um cortar de meta em grande estilo. Parece um sonho. E neste momento, não sei se sentes o mesmo, mas eu sinto um pouco aquele tal vazio. O grande objectivo está conquistado. Podemos repetir, mas nunca será como a primeira vez. Poderemos tentar melhorar o tempo, mas nunca haverá a euforia de conquistar a distância. É como fazer a maratona pela primeira vez, ou mesmo a meia maratona.
    Parabéns! Este foi o momento em que se percebe que todos os esforços valeram a pena e onde é preciso mimar todos aqueles que nos aturaram as ausências durante longos períodos. Também eles foram vencedores nesta prova.
    E agora, vai treinar que o corpo não quer moleza ;)

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Muitos Parabéns!!! Uma façanha de que nunca te irás esquecer!

    Gostei do relato, é uma boa descrição de como a prova se desenrolou e daquelas cosias q nos passam pela cabeça quando estamos naquele tipo de apuros...

    Muito bom, e se quiseres e puderes... pois haverá mais desafios deste calibre, sempre prontos a serem desafiados! :-)

    Bjinhos

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  6. Olá, Parabéns...subscrevo praticamente tudo o que dissestes e realmente a parte da corrida foi o mais duro para mim...Eu era um daqueles Portugas que estava no ultimo abastecimento a comer fruta...:):)

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  7. queres comentários! umumum...
    os 200km do Troia-Sagres já foram, o 1/2 Ironman já foi..., e agora??? próximo desafio já preparado para fevereiro de 2014!!!
    de resto, Parabens, não pela prova, mas pelos meses de treinos e de "sacrificios" familiares, TRIMÃMÃ ;)

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  8. Muitos Parabéns!!! Tenho o meu irmão que também faz triatlos longos, inclusive vai agora em Junho a Nice fazer o Ironman, e sei bem dar o valor do esforço!!!! Impressionante!! Muitos Parabéns e continuação de boas provas :D

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  9. Se não fosse a família que seria de ti? ... sem dúvida, quem está de Parabéns é a família, pois os sacrifícios maiores são dela também. Para ti foi mais uma prova que acabaste ... muito bom, que continues com essa gana de ultrapassar desafios.

    fsilva

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  10. Parabéns Lénia, sem mais palavras até porque as não tenho.
    Com admiração.
    António Almeida

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  11. Grande Lénia! Estás muito bem! Dá gosto ver e ler! Muitos Parabéns pela força que tens, e só tu e os teus sabem com que sacrifícios! Beijinho

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